Governo recua e muda decreto para nomear cargo comissionado

Renato Onofre e Julia Lindner

BRASÍLIA – Pressionado por líderes partidários da Câmara, o governo cedeu nesta terça-feira, 19, e decidiu alterar o decreto que estabelece exigências mínimas para o preenchimento de cargos no governo. A proposta, anunciada como uma agenda moralizadora pelo presidente Jair Bolsonaro, foi criticada por ignorar as nomeações já feitas pelo Palácio do Planalto.

A avaliação no Congresso era de que a medida era uma tentativa de perseguição à classe política no momento em que se discute a maior participação de representantes do Congresso.

“Foi muito aplaudido o decreto, mas tem que valer para todos. Os líderes querem entender por que os que foram nomeados até ontem não precisavam cumprir o rito da Lei da Ficha Limpa e os que serão nomeados daqui para frente precisarão. Acho que todos precisam passar pelo mesmo filtro”, disse o presidente da Câmara, Rodrigo Maia.

Conforme mostrou o Estado, o discurso oficial do governo é o de criar uma espécie de “banco de talentos” formada por indicações de parlamentares para preencher cargos nos ministérios e nos Estados. Os nomes levados aos articuladores políticos por deputados e senadores serão avaliados segundo estes critérios. Dos 24 mil cargos de direção e assessoramento (DAS) e funções comissionadas (FCPEs) atingidos pela nova norma, cerca de 3,7 mil ainda estão vagos.

Após as reclamações, porém, o governo decidiu antecipar de maio – como estava inicialmente previsto – para janeiro deste ano a validade do decreto que exige critérios como idoneidade, formação e experiência para cargos comissionados em todos os órgãos do governo federal. Na prática, a medida faz com que os efeitos do decreto sejam retroativos e devem ser aplicados até mesmo para quem já foi nomeado.

Como o presidente Jair Bolsonaro estava fora do País nesta terça-feira, em viagem aos Estados Unidos, as novas regras só devem ser publicadas hoje, em edição extra do Diário Oficial da União.

Parlamentares pressionaram Maia durante almoço

A pressão dos parlamentares contra o decreto foi combinada em almoço de Maia com líderes da Casa. Na conversa, os deputados relataram a insatisfação com a maneira que o governo está tratando as indicações políticas – o Estado revelou no sábado que entre as exigências estava a assinatura de um documento em que o parlamentar se comprometia com a indicação.

Durante o almoço, o ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, ligou para Maia que, na frente dos parlamentares, falou da insatisfação do grupo sobre a medida. Eles ameaçavam, inclusive, derrubar o decreto por meio de um projeto.

Logo após o recado de Maia, a Casa Civil acionou as principais lideranças no Legislativo para tentar conter a insatisfação. Durante toda a tarde, governistas indicaram que o Planalto recuaria. A líder do governo no Congresso, Joice Hasselmann (PSL-SP), minimizou as críticas e afirmou ao Estado que o governo “está ouvindo os pleitos dos parlamentares”.

Enquanto a mudança não era anunciada, o que só ocorreu à noite, parlamentares ocuparam a tribuna para criticar a medida.

“O decreto não vale para os ministros. Como se faz um decreto que se aplica ao DAS (servidores comissionados), mas não se aplica ao ministro? O DAS tem que ter reputação ilibada e idoneidade e o ministro não? Ele é menos relevante?”, questionou no plenário o deputado federal Daniel Coelho (PPS-PE). “Não podemos aceitar um decreto que venha depois que o governo já nomeou 70% dos seus cargos.”

De acordo com as regras, publicadas anteontem, não poderão exercer cargos no governo federal pessoas que tenham sido consideradas inelegíveis com base na Lei da Ficha Limpa. Em 2010, a Lei de Inelegibilidade foi alterada pela Ficha Limpa e passou a considerar inelegíveis por oito anos os condenados por crimes como corrupção, lavagem de dinheiro, abuso de autoridade e ocultação de bens.

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